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Domingos de Arrelia
A casa era grande e acolhedora e ali se reunia a numerosa família para almoços de domingo. Gente de todas as idades; boa conversa, animação e diversão para os mais variados gostos. As crianças tinham ao seu dispor alguns brinquedos, TV, revistas, gibis. Lá fora, na garagem, um patinete e dois velocípedes, embora insuficientes para todos, serviam para permitir alguns pegas ao redor da casa. Em tempo frio, era possível as crianças fazerem a volta completa livre de obstáculos, mas nos dias mais quentes, abria-se a janela da sala, e alguns adultos iam para fora impedindo a veloz passagem dos pequenos competidores. Só depois de muita bronca é que a molecada deixava de transitar entre os que se acomodavam em cadeiras ou permaneciam em pé. Alguns pés, naturalmente, acabavam atropelados, algumas canelas marcadas, mas não há memórias de calças cortadas.
Na hora do almoço, a correria era suspensa. As crianças, já exaustas, eram levadas para uma pequena sala com televisão, onde faziam suas refeições. Para mantê-las mais sossegadas, a TV era ligada no tradicional programa do Circo do Arrelia, o mais famoso palhaço da história do Brasil. "Como vai, como vai, como vai!", chacoalhava ele a mão de seu parceiro, Pimentinha, que respondia: "Tudo bem, tudo bem, bem, bem!". Estava aberto o divertido horário, e disparada as confusões inconseqüentes, provocando saborosas risadas no público infantil, e em alguns pais que vinham disputar o pequeno espaço.
Terminado o domingo, retornavam todos para suas casas. "Dormir cedo, amanhã é dia de escola". Duas vezes por semana todos tinham aula de ginástica, dada sem grandes explicações. "Um, dois, um dois, um dois, um dois...., vamos, vamos, força, mais força, mais uma vez. Descansar!" Rir dos mais desajeitados fazia parte do jogo. Não raro a brincadeira era cruel, mas fazia parte da infância.
Virá a época do trabalho, da responsabilidade, de constituir a própria família, dos filhos, da busca pela felicidade...
Um dia se encontram dois dos primos no parque: o eterno vencedor e outro que brincava ou simplesmente jogava. Estavam ambos com filhos pequenos aprendendo a pedalar sem as rodinhas protetoras. Fim da era do patinete e do velocípede e um parque inteiro só para eles, as crianças. Veja só, pelo menos é como eles, os pequenos, vêem a situação. Muitos tombos pela frente, alguns dignos do Circo do Arrelia. E a vida mostra aos primos que ensinar a rir é a melhor educação. Não dá para cair e desistir. É melhor sorrir. |
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